Vinte e quatro volumes da Enciclopédia Britânica na cabeça de um alfinete
Um visionário
Há Físicos que são honrados pelo prémio Nobel da Física e há outros que honram o mesmo prémio. Richard Feynman (1918-1988) pertence a esta última estirpe. Numa palestra visionária, dada no encontro anual da American Physical Society (29/12/1959), com o título “There’s plenty of room at the bottom” (esta palestra encontra-se transcrita em http://www.zyvex.com/nanotech/feynman.html), Feynman fez a seguinte pergunta: “Será que podemos escrever os 24 volumes da Enciclopédia Britânica na cabeça de um alfinete?”.
Seguidamente Feynman argumenta que sim. Uma estimativa revela que se aumentarmos 25000 o tamanho linear da cabeça do alfinete, esta fica com uma área igual à de todas as páginas da dita enciclopédia. Portanto, bastará diminuir a escala linear das letras da enciclopédia britânica 25000 vezes para responder afirmativamente à questão.
Ora, as letras são formadas por pontos cuja escala linear é da ordem do limite de resolução do olho humano: aproximadamente 0.2 mm. Diminuído 25000 vezes, cada ponto fica com um tamanho de cerca de 8 nanómetros (0.000008 mm). Num metal vulgar esta escala tem 32 átomos e, portanto, a área do ponto irá conter cerca de 1000 átomos.
Logo, se conseguirmos manipular átomos individuais, existe mais do que espaço para escrever toda a enciclopédia britânica na cabeça de um alfinete!
Na sequência, Feynman diverte-se um pouco extrapolando o raciocínio: “Qual o espaço necessário para escrever todos os volumes produzidos pela raça humana?”. Em 1959 Feynman estimou este número em 24 milhões de volumes.
Necessitaríamos pois de um milhão de cabeças de alfinete, ou seja, uma área constituída por 1000 alfinetes de lado, mais ou menos dois metros quadrados – a área de 34 páginas A4. Todo o conhecimento alguma vez escrito pela humanidade cabe numa fina revista!
Uma realidade
Desde a década de 1990, fazendo uso do «Atomic Force Microscope» e de uma técnica denominada «Scanning Tunneling Microscopy» tem sido possível a manipulação de átomos individuais. Entre as imagens que se tornaram ícones deste processo encontra-se a da IBM, onde o nome da empresa se encontra escrito por 35 átomos individuais de Xenon (anunciada em 1990).
Figura IBM
Em 1991, os «nano-tubos» foram descobertos. São estruturas de átomos de carbono com propriedades físicas muito interessantes; por exemplo suportam tensões 100 vezes superiores às suportadas pelo aço, tendo um peso cerca de 6 vezes inferior.
Figura Nano-Tubo
Estes são dois exemplos de que a nanotecnologia já existe. De facto, num certo sentido já existe há muito tempo: se a entendermos como a capacidade de fazer estruturas pequenas com utilizações interessantes. Existem no mercado produtos, desde tintas a cosméticos, onde a dopagem de um certo material por nano-partículas altera, num sentido pretendido, as propriedades do material. Esta nanotecnologia existe, e não é mais do que ciência dos materiais usando técnicas e tecnologias modernas. Mas existe um sentido muito mais excitante para «nanotecnologia».
Um admirável mundo novo?
Em 1981 (Proc. Natl. Acad. Sci. USA, Vol. 78, No. 9, pp. 5275-5278) Eric Drexler publicou um artigo intitulado “Engenharia Molecular: um método para o desenvolvimento de capacidades gerais para manipulação molecular”. A visão de Drexler, desenvolvida no seu livro “Engines of Creation” (1986) baseia-se numa máquina molecular que poderemos denominar por «montador» (assembler) que pode colocar átomos em «quase todos os arranjos razoáveis» e construir «quase tudo que as leis da natureza permitam que exista».
A mudança de paradigma na visão de Drexler é que o conceito de «construir» será substituído pelo conceito de «semear e crescer». As nano-máquinas, inicialmente desenhadas por humanos, serão capazes de se autorreplicar, eventualmente modificando as suas propriedades de geração em geração e desenvolver a máquina (ou efeito) desejada praticamente sem mais intervenção dos seus construtores humanos.
É esta visão revolucionária (e perigosa) da nanotecnologia que é abordada muitas vezes na ficção científica, como no estimulante livro de Michael Crichton «Prey» (2002) . Mas claro que, como nos recorda Arthur C. Clarke no prólogo do seu clássico «2001-Space Odissey», «a realidade será sempre mais estranha do que a ficção».
*Carlos Herdeiro, Departamento de Física da Universidade de Aveiro. Pode encontrar parcialmente este texto no programa de sala do NANO T.
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